O filme Bohemian Rhapsody, lançado em novembro de 2018, foi uma grande aposta britânica para a temporada de premiações (2019) e recebeu mais de 60 indicações. Só no Oscar foram quatro vitórias e no Bafta foram duas, ganhando a de Melhor Ator pela atuação de Rami Malek e Melhor Som pelo trabalho de John Casali e sua equipe. 

 Vale lembrar que o filme perdeu a indicação em Melhor Filme, dias antes do Bafta, por causa das acusações de assédio, abuso sexual e pedofilia contra o diretor Bryan Singer. E mais, o filme não levou a melhor na categoria de Melhor Figurino. Seus concorrentes foram os longas que já falamos por aqui: A Balada de Buster Scruggs, A Favorita, O Retorno de Mary Poppins e Duas Rainhas. E quem ganhou mais uma vez foi a figurinista Sandy Powell por A Favorita

 Bohemian Rhapsody foi sucesso de bilheteria e mostra a trajetória da banda Queen entre as décadas de 1970 e 1980, com cenas da formação do grupo, das gravações dos álbuns, shows e momentos de solidão de Freddie Mercury. A banda foi sucesso do rock britânico com músicas como We Will Rock You e Don’t Stop Me Now. O filme não é um documentário, é um drama que vai resumindo os passos da banda até o festival Live Aid, fase super importante para a banda se reerguer e pela arrecadação para combater a fome na Etiópia. Você pode assistir ao trailer aqui

 Mesmo com toda a repercussão negativa por causa da direção do filme, Bohemian Rhapsody conseguiu reproduzir momentos icônicos da banda sendo fiel a realidade, com um figurino e direção de arte muito bem feitos.  Outro ponto positivo é o elenco: Rami Malek (Mr. Robot) - Freddie Mercury, Joseph Mazzello (Elementary) -  John Deacon, Ben Hardy (X-Men: Apocalipse) - Roger Taylor, Gwilym Lee (O Turista) - Brian May,  Lucy Boynton (Gypsy) - Mary Austin, Tom Hollander (Bird Box) - Jim Beach, Aidan Gillen (Game of Thrones) - John Reid, Allen Leech (O Jogo da Imitação) - Paul Prenter. 

Indo direto para o figurino que foi indispensável para a caracterização de cada personagem, temos o trabalho de Julian Day, um figurinista britânico que não é tão conhecido. Seu trabalho mais conhecido foi no filme Diana (2013), que fala sobre um dos romances da princesa Diana, e o mais recente foi em Robin Hood - A Origem (2018), com atuações famosas de Jamie Foxx e Eve Hewson (filha de Bono Vox - U2). 

O figurino já se mostra essencial no início do filme, na cena em que Freddie acaba conhecendo Mary por elogiar seu casaco e ela fala que é da loja onde trabalha. Ele vai até a loja e mesmo sendo feminina, ele se identifica com uma peça, deixando seu estilo andrógino evidente. 

 Todos os personagens passam por uma mudança de estilo na medida em que ficam famosos, mas Freddie foi o que mais mudou o visual, começando com calça boca de sino e terminando com macacão decotado e bem brilhante. O cantor era conhecido por ser diferente, não só pelos dentes, como pelo jeito de dançar no palco e de se vestir, que deixava as pessoas curiosas sobre sua sexualidade. Se hoje levantam a questão de roupas por gênero, naquela época que era um tabu, Freddie ia contra os padrões e usava lápis de olho, batom e muita coisa que ainda é vista como feminina. 

  “Eu acho que é difícil para as pessoas que não viveram naquela época entender como era diferente se vestir como ele”, o figurinista comenta para a Vogue e ainda lembra que o clipe de I Want To Break Free foi banido da MTV por mostrar os integrantes da banda maquiados e vestidos de mulheres, justamente porque homens não eram vistos usando o que era considerado feminino. 

 O que esperar de um figurino dos anos 70? Eles usam bastante calça boca de sino), camisas estampadas, camisetas baby look (mais apertadas e com as mangas mais curtas), coletes e jaquetas de camurça. Detalhe importante: nessa época não tinha minimalismo e eles usavam muitas cores! 

 O estilo dos personagens acabou sendo comparado com o dos anos 30 e o figurinista comentou sobre essa semelhança: “A silhueta dos anos 30 seguiu até os anos de 1970, as calças masculinas tinham cintura mais alta e com a barra mais aberta, e as roupas femininas eram parecidas. Mary Austin (ex-namorada de Freddie) trabalhou na Biba (boutique de roupa feminina que ficou famosa nos anos 60 e 70 em Londres) e todas as estampas de lá eram inspiradas nos anos de 30. A moda é um ciclo, eu acho que toda época se parece com outra”, disse Julian Day. 

 Na entrevista para o site Deadline, o figurinista comenta que o jeito do ator Rami Malek mergulhar fundo no personagem ajudou muito seu trabalho, porque se a interpretação não fosse fiel, o figurino não iria funcionar.  Ele disse que tiveram que fazer várias provas de roupas para tudo estar certo já que o ator tinha muitas cenas de performance e precisava estar confortável.  

 A pré-produção começou pelo básico, olhando o roteiro e pesquisando imagens na Internet, mas depois ele teve acesso ao arquivo de fotos do Queen e foi convidado pelo guitarrista Brian May para ver as roupas que ele usava na época. O diferencial foi que ele quis conhecer melhor a banda e escutar as músicas para realmente entrar no projeto tendo em mente quem eles eram.  

 Para iniciar seus desenhos e ter noção do que teria que fazer, ele conversou com o diretor Singer, porque ele tinha que se preocupar com duas situações de roupas para os personagens: roupas que teriam que ser idênticas às originais e outras que eram do cotidiano (as que ele não tinha muitas referências por foto e teve que pesquisar mais).

 A cena do festival beneficente Live Aid teve que ser totalmente fiel, ainda mais porque os fãs se lembram de momentos icônicos da banda e por ser uma cena mais longa: “Pareciam roupas simples - jeans e regata - mas era difícil de recriar porque aparece no filme várias vezes, então tinha que ser idêntica. Eu falei com a Adidas e eles recriaram os tênis que Freddie e Brian usaram, entrei em contato com quem fez o cinto e o bracelete original, e também falei com a Wrangler (marca) para conseguir uma calça igual a que Freddie usou”. O orçamento do filme parece que foi bom né? 

Detalhe: para melhorar a situação do figurinista, ele tinha não só o orçamento bom, mas também uma equipe de 38 pessoas, como conta o site E!.  

Outras cenas que o figurinista se preocupou em recriar as peças foi a do show no Rio de Janeiro, onde ele usa calça de couro vermelha e um macacão quadriculado, e a da turnê no Japão, quando Freddie e Brian usam blusas feitas pela designer e amiga dos integrantes, Zandra Rhodes. A roupa branca foi feita com ajuda da própria designer Zandra, que contou à Vogue que essa é uma das roupas que todos se lembram dele usando, mas foi alterada para uma cor mais clara para mostrar mais os movimentos.

 A blusa tinha sido planejada como um vestido de casamento, mas como Freddie era amigo da designer e comentou que gostou da peça, ela separou da saia. 

 Olha, caso você não conheça, vale a pena pesquisar um pouco sobre a figura que é a estilista britânica Zandra Rhodes.

O desafio para o figurinista foram as cenas de shows, porque a maioria mostrava a plateia  e tinha que parecer real: “O orçamento era alto, mas não tanto, então para não extrapolar fui em um lugar em Barnsley, no norte da Inglaterra, onde vendiam roupas por quilo. Fui com mais 10 pessoas e ficamos lá por três ou quatro dias, escolhendo peças dos anos 80 para a cena do Live Aid. Era uma cena com quase 600 pessoas para vestir e mais de 1000 peças”. 

 Uma curiosidade contada ao site Emanuel Levy é que nenhuma das peças foi usada mais de uma vez. Julian Day disse que nunca tinha feito tantas provas de roupa como nesse filme e que só as roupas dos quatro membros da banda ficaram em um ônibus todo (aqui no Brasil a gente usa caminhão para colocar os figurinos). No total foram feitas entre 8 a 10 mil peças, contando com figurantes. 

 As provas de roupas também foram inúmeras, o ator Rami Malek (que interpreta Freddie) estava muito empenhado em deixar tudo parecido com as roupas usadas originalmente e até dava dicas para o figurinista. Os dois se deram super bem e a primeira prova durou quase 5 horas, tirando o detalhe que foram cerca de 40 provas para provar todas suas roupas. Inclusive, na cena do Live Aid o ator ajudou o figurinista: “Um dia antes da gravação, Rami me disse que olhou os vídeos do show e percebeu que a regata tinha um formato diferente. Eu percebi que estava mais decotada, era menos de um centímetro, mas fazia diferença e Rami estava certo”, disse Julian Day ao site Tatler

 Outra marca que colaborou com a produção das roupas foi a Swarovski, que já fez essa parceria com o figurinista antes e dessa vez ajudou com o macacão brilhante de Freddie Mercury.  

 O figurinista comenta que mesmo tendo pesquisado bastante para tudo ser fiel às roupas originais, ainda não foi suficiente para agradar a todos, mas que ficou contente com o trabalho. O filme Bohemian Rhapsody não ganhou pelo figurino no Bafta nem no Oscar, mas Rami conseguiu levar a estatueta de melhor ator. 

 Agora que você já sabe um pouco sobre o figurino de Bohemian Rhapsody, conta nos comentários qual é a peça que você mais gostou.  

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