Nova época aqui no Blog minha gente!

 Agora vamos contar com colaborações de ex-alunas minhas que escrevem muito bem sobre figurino.

 E para começar vamos ver a análise impecável que a Gabriela faz de figurino.

Eu a conheci pelo Instagram @costumedesign.br, segue que vale a pena.

Ela veio fazer meu curso e inclusive no meu instagram - @alicealves.com.br -  tem nos destaques uma entrevista com a Gabriela porque eu nunca vi igual  o jeito de analisar figurino, ela consegue captar os detalhes mais incríveis do figurino e o texto é uma delícia de ler.

Mas chega de introdução e vamos ler a deliciosa análise que ela faz desse clássico que é Bonequinha de Luxo.

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Bonequinha de Luxo é um dos meus filmes favoritos. Muitas décadas depois, ele ainda é lembrado pela perfeita convergência entre moda e figurino. Edith Head, Hubert de Givenchy e Pauline Trigere trabalharam conjuntamente; o resultado foi a criação de peças lindas e com propósito.

Além disso, o filme traz personagens complexos disfarçados como tipos de uma comédia romântica leve, começando pela protagonista, Audrey Hepburn, como Holly Golightly. A princípio, o autor do romance, Truman Capote, queria Marilyn Monroe no papel, mas ela o recusou, por não querer associar-se a uma garota de programa. Na verdade, todos na Paramount estavam preocupados com a reação do público de 1961 ao filme, especialmente quando o roteirista George Axelrod foi contratado. Ele era conhecido por O Pecado Mora ao Lado, uma peça de conteúdo sexual (depois um filme de Billy Wilder). Surpreendentemente, Audrey assumiu o risco e juntou-se ao projeto, embora seu filho tivesse apenas 2 meses de idade quando as filmagens começaram. Para mim, ninguém poderia ter interpretado melhor o papel: ela emprestou elegância, ternura e profundidade a Holly.

Há alguém que não conheça este vestido? Há alguém que não goste dele? O vestido preto que Audrey Hepburn usava durante o 1º dia de filmagem de Bonequinha de Luxo é elegante e atemporal. Você pode achar fantástico o vestido da Cinderela ou o figurino de Cleópatra, mas você nunca os usaria na vida real. O vestido preto de Holly Golightly é atingível - exceto pelo fato de ser um Givenchy, claro! O público pode facilmente se conectar com Holly e desejar seu visual. O estilo é simples, porém glamouroso. O vestido sem mangas não tem adornos na frente do corpete justo e só atrás você encontrará um decote surpreendente. Inicialmente, haveria uma saia com fenda, mas Edith Head, como supervisora de figurino, mudou o modelo para que não mostrasse as pernas de Audrey. O famoso cartaz criado por Robert McGinnis mostra a versão original. Holly também usa um par de luvas longas pretas, um colar de pérolas falsas projetado por Roger Scemama, óculos de sol Oliver Goldsmith (modelo Manhattan, com armação de tartaruga e lentes verdes), bolsa e scarpins pretos.

Tão populares hoje, vestidos pretos não eram uma escolha óbvia nos anos 1950 e início dos anos 1960. Várias mulheres que trabalharam durante a 2ª Guerra Mundial estavam de volta ao lar, para serem só donas de casa e mães. O estilo mais feminino substituiu o utilitarista e, então, vestidos florais viraram tendência. Historicamente, o preto era associado a viúvas e também a mulheres independentes, fortes e sedutoras - como a personagem de Anita Ekberg em La Dolce Vita (1960). Os vestidos pretos de Holly (Audrey Hepburn) são um símbolo de seu estilo de vida não tão virtuoso. Roupas pretas são convenientes para quem não dispõe de muitos recursos: elas são versáteis (Holly consegue um novo visual a cada troca de acessórios) e não precisam de cuidados excessivos (menos custos de lavanderia e mais tempo até que pareçam gastas). Preto também é uma alternativa segura para quem não tem muita informação de moda (Lula Mae/ Holly era uma caipira originalmente). Finalmente, o vestido preto que fez Audrey parecer tão elegante diante da vitrine da Tiffany´s também revela sua melancolia e solidão.

O vestido longo preto da cena de abertura é muito famoso, mas o vestido “de coquetel” de Holly (Audrey Hepburn), na altura dos joelhos, com decote oval, um nó abaixo dos seios e plumas na parte inferior, parece ser o seu favorito. Ela o veste repetidas vezes, com acessórios diferentes que tornam cada look único. Normalmente, ela escolhe chapéus e bijuterias chamativos, que indicam sua personalidade extrovertida. Como a equipe de marketing da Paramount deixou claro, Holly era “kook”, o que significa que ela era legal, descolada, engraçada, espontânea, meio maluquinha, mas nunca uma moça promíscua ou de gosto duvidoso. Ela era uma garota de programa e deveria chamar a atenção dos homens, mas, naquela época, era preciso lidar com o assunto cuidadosamente. A sutileza foi essencial para o sucesso do filme e, antes disso, para a contratação de Audrey (o papel a deixou muito apreensiva).

 

Conta-se que, na década de 1960, várias pessoas que viram o filme não perceberam que Holly (Audrey Hepburn) era, na verdade, uma garota de programa. Mas, se você esteve atento, deve ter notado que seu comportamento é, no mínimo, pouco conservador e discreto. Algumas peças do figurino podem provar isso. A 1a vez que Paul Varjak (George Peppard) toca a campainha de seu apartamento, ela abre a porta com uma camisa masculina branca - deixada por um cliente, talvez? - muito curta e transparente. Ela não tem nenhum pudor em aparecer assim na frente de um completo desconhecido! À noite, ela entra no apartamento de Paul pela janela, vestindo só uma camisola e um roupão branco, vai para a cama dele e deita em seu peito nu. Definitivamente, isso não seria apropriado para uma garota dessa década... Finalmente, quando ela estava dando uma festa em sua casa, alguns convidados chegaram antes de ela terminar de se aprontar. Nenhum problema! Ela simplesmente foi até a sala coberta só por uma toalha de banho, amarrada de um jeito criativo. Minutos depois, ela voltou à festa com seu vestido preto favorito.

Quando o filme foi lançado, Paul Varjak (George Peppard) não recebeu tanta atenção quanto Holly (Audrey Hepburn) em relação a estilo, mas suas roupas - criadas por Edith Head - são fantásticas! Chiques sem esforço, seus trajes não contrastam muito com as tendências atuais, já que essas estão sob forte influência da moda dos anos 1960. Paul provavelmente não veio de uma família próspera, mas seu guarda-roupa faz com que ele pareça um ex-aluno tradicional da Ivy League (jovem de classe social privilegiada que usa roupas masculinas clássicas ou conservadoras com um "twist"). Certamente, isso se deve a 2-E, que conhecia o estilo preppy e podia pagar por boas roupas para presentear Paul. Ele usa tendências típicas do final dos anos 1950 e início dos anos 1960: corte ajustado ao corpo, ternos elegantes em cores neutras, lapelas finas, bolso quadrado com lenço, gravatas estreitas com barra reta, camisas brancas simples (às vezes azuis) com gola pontuda, calça “slim” com frente plana e cardigans.

Os figurinos de Emily Eustace Failenson (Patricia Neal) foram desenhados pela estilista francesa Pauline Trigere, que tinha uma marca muito popular nos Estados Unidos nos anos 1950 e 1960 e, de fato, criava peças para a elite nova-iorquina. Só de olhar para Emily (ou 2-E, como seu jovem amante a chama) saindo do táxi já seria possível perceber que ela era de classe alta. Ela usa um refinado tailleur verde com botões grandes, broche de ouro e pérolas, chapéu estiloso, luvas de camurça, estola de pele, bolsa marrom claro e um vistoso anel de diamante. 2-E usa outra roupa verde ao ligar para Paul a fim de cancelar um encontro, porque seu marido voltara para casa mais cedo. Desta vez, ela usa um longo vestido de cetim, seu valioso anel novamente e uma grande pulseira de ouro amarelo. Nos EUA, é muito comum associar verde a dinheiro - em Trama Fantasma, por exemplo, Mark Bridges justificou a escolha de tafetá verde para o vestido de uma herdeira americana pela relação da cor com cédulas de dinheiro. Emily ou 2-E (Patricia Neal) tem claro interesse por moda, como podemos ver nas roupas “fashionistas” dela, e tem dinheiro suficiente para bancar roupas e acessórios sofisticados. Em dado momento, ela usa uma capa de lã cinza escura com gola alta, combinada a luvas e um turbante vermelho. O look é apropriado para sua personalidade forte e dominante e também conveniente para esconder seu rosto enquanto se esgueira até o quarto de seu amante. No dia em que Paul (George Peppard) lhe diz que pretende terminar o relacionamento, ela está usando um casaco xadrez azul de silhueta larga com uma saia no mesmo tecido e uma bolsa preta. Vocês provavelmente se lembram de que o azul está relacionado a tristeza e melancolia.

Doc Golightly (Buddy Ebsen) vai a Nova York para convencer Holly (Audrey Hepburn) a voltar para casa, no Texas. Ele está triste e preocupado com ela, então veste cinza, a cor usual de personagens em apuros ou psicológica/emocionalmente abalados. Seu estilo caipira contrasta com a sofisticação cosmopolita de Paul (George Peppard). Doc veste um paletó longo sem bolsos e com lapelas largas. Seu traje não tem bom caimento: ele parece grande na parte superior, mas tem calças curtas. Ele também usa botas de caubói e um chapéu modesto. Quando Paul conhece Doc, no Central Park, o escritor parece uma versão atualizada (e mais descolada) do ex-marido de Holly: ambos usam paletós na cor cinza e camisas azul claras. A própria Holly veste peças nessas cores frias quando fica nostálgica em relação a sua vida no campo e canta a música "Moonriver” (Henry Mancini/ Johnny Mercer). Ela usa um moletom cinza, calças jeans e sapatilhas - sua roupa mais casual no filme. Quando ainda era Lula Mae (esposa de fazendeiro e madrasta de seus filhos), ela costumava usar vestidos florais simples de algodão.

Quando Paul (George Peppard) e Holly (Audrey Hepburn) saem juntos para fazer coisas nunca antes feitas, ela usa um elegante casaco de lã laranja com gola alta. O tom vibrante espelha seu humor: ela está feliz e animada por estar na companhia de Paul, longe dos "ratos" por um tempo. Em contraste, quando ela não quer muita intimidade com as pessoas, ela se veste de preto. Ela também usa brincos de pérola, grandes óculos de sol e uma bolsa com corrente dourada. Por baixo do casaco, há um vestido justo preto-e-branco com comprimento na altura dos joelhos. Ela calça sapatos de couro de jacaré e, sobre seu cabelo multicolorido (como um gato malhado), há um chapéu de pele marrom (Holly já mencionara sua natureza selvagem certa vez). Além disso, pele animal está relacionada a sexualidade, então não é coincidência que Holly tenha passado aquela noite no apartamento de Paul. Em relação às máscaras que eles usam, Holly escolheu um gato, enquanto Paul, um cachorro. Os gatos são conhecidos por sua independência e liberdade (Holly se recusa a viver “presa” a alguém), enquanto os cães são mais afetuosos, leais e carentes.

José da Silva Pereira (José Luis de Villalonga) veste-se sempre com trajes clássicos e escuros. Quando ele é convidado para uma festa no apartamento de Holly (Audrey Hepburn), ele aparece vestindo um terno risca-de-giz azul marinho com uma camisa azul clara por baixo e gravata listrada. Embora o evento não fosse muito formal, ele não desabotoou seu paletó (ao contrário dos outros convidados), o que mostra que ele é conservador e cuidadoso com sua própria imagem. Seu segundo look é um smoking marinho com lapelas largas e botões cobertos, camisa branca e gravata-borboleta preta. Por cima, ele usa um casaco de lã escuro com ombreiras e lenço de seda branco em volta do pescoço. Ele sempre usa uma pulseira de corrente de ouro que, juntamente com seu guarda-roupa sofisticado, indica que ele é um homem rico. Suas preocupações sobre a reputação de sua família aristocrática refletem no seu estilo: não há um único fio de cabelo fora do lugar! Ele sempre aparece arrumado e elegante.

Quando Holly (Audrey Hepburn) vai a um encontro com José (José Luis de Villalonga), ela usa um vestido pink sem mangas, com strass, borlas (“tessels”) e um laço na cintura. Esse visual é muito diferente de suas roupas anteriores! Em primeiro lugar, é uma nova silhueta: vestido semicircular, em vez de vestidos de corte mais seco ajustado, como de costume. Ainda, ela frequentemente usa cores neutras (com exceção do casaco e do robe laranja). Rosa faz Holly parecer mais feminina, delicada e doce. Os ornamentos do vestido (associados a sapatos cor-de-rosa, capa e tiara brilhante) a deixam atraente e encantadora. Ela é como um doce na vitrine, apenas se exibindo para obter atenção e aprovação de José. O figurino remete à intenção de Holly de “criar laços” com um bom partido e mudar seu estilo de vida. A roupa mostra a tentativa dela de aparentar ser o tipo de esposa que José gostaria de ter, a despeito de sua autenticidade e seus gostos pessoais.

No figurino de Holly (Audrey Hepburn), as roupas de cores claras (como branco, bege e cinza) representam um estado de espírito oposto ao simbolizado por roupas pretas. Quando ela está mais relaxada, exposta, vulnerável e autêntica (entre pessoas mais íntimas), ela usa cores claras. Quando está mais reservada e distante, mas precisa mostrar confiança e audácia - geralmente no trabalho (como garota de programa ou informante de Sally Tomato) -, ela usa principalmente roupas pretas, que funcionam como uma armadura para ela. Ao lado dos vestidos escuros, ela usa grandes óculos de sol que nos impedem de fazer uma leitura de suas emoções, ela fica sem expressão. Quando Holly vai para a rodoviária se despedir de Doc (Buddy Ebsen), ela está vestindo uma saia lápis em preto-e-branco, com padrão espinha de peixe, e uma camisa polo preta, mas ela cobre a roupa escura com um casaco bege e seu cabelo multicolorido é preso embaixo de um lenço; assim, em um minuto, a cosmopolita e independente Holly se foi, e Doc ainda pode reconhecer a genuína Lula Mae.

Na sequência final, a “autossuficiente” Holly (Audrey Hepburn) troca o suéter bege/ cinza por um vestido preto (que funciona como um escudo ou armadura) no táxi porque ela quer convencer Paul (George Peppard) - e ela mesma - de que não pode se apegar a ninguém (“pessoas não pertencem umas às outras”, ela afirma). Mas, então, Paul dá a ela o anel tirado da caixa de biscoitos e ela muda de ideia. Nesse ponto, a roupa preta não está mais em cena, é claro! Holly havia vestido um “trenchcoat” bege sobre aquela. Ela não usa óculos escuros nem penteado elaborado; ela tem “maria chiquinhas” infantis em vez disso. Em prantos, ela busca recuperar o Gato numa demonstração de que, contrariando seus planos, ela criou vínculos afetivos com o bichinho. Nada diferente do que ocorreu em sua relação com Paul. Ele também está usando um casaco bege na cena final, em um tom ligeiramente mais escuro, então podemos ver que há uma conexão entre eles, eles parecem muito semelhantes e harmônicos juntos.

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